A história do Rei do Baião
contada em forma de poesia de cordel
GONZAGA, SAGA &
SAUDADE
Autor: Paulo
Tarciso
É com imenso prazer
Que peço a vossa atenção,
Para fazer uma homenagem
A um grande campeão,
Nem futebol, nem corrida,
Mas que aqui nesta vida,
Chamou-se “Rei do Baião”.
No dia 13 de Dezembro,
Mil novecentos e doze, o ano,
Lá na fazenda Caiçara,
Nordeste pernambucano,
Na Serra do Araripe,
Um povo que não desiste
De realizar seus planos.
Januário dos Santos, o pai,
Um sanfoneiro bacana,
Luiz Gonzaga,
o rebento,
A mãe, Ana Batista Santana,
Esse casal não sabia,
Que seu filho ali saia
Da barriga pra sanfona.
- 1 -
O nome ficou Luiz,
Pois ele nasceu no dia
Que na tradição se lembra
Festa de Santa Lusia,
O sobrenome Gonzaga,
Foi a pedido do padre
Novo herdeiro na “famia”.
“Nascimento” complementa
O nome do campeão,
Por ter nascido em Dezembro,
Mês de confraternização,
“refém” ao Natal -Jesus,
A festa que brilha a luz,
Do amor e da união.
O velho seu Januário,
Como era de tradição,
Naquele tempo de outrora,
Nestas terras do Sertão,
Tinha filho todo ano,
E se agora não me engano,
Gonzaga teve oito irmãos.
A riqueza da “famia”
Era mais a plantação;
Milho, mandioca e banana,
Principalmente o feijão,
Conserto em velhas sanfonas
E a colheita de mamona,
Com a ajuda dos irmãos.
Naquele tempo era o samba,
A música que aqui se ouvia;
Januário enchia o fole,
Depois pegava a enxada,
Para a roça se mandava
Enquanto a seca batia.
Em meio à seca reinante,
Arrancavam caroá,
Faziam cordas e vendiam
Para as despesas ajudar
Pra feira se dirigiam,
Pouco lucro lhe rendia,
Mas tinham que trabalhar.
E quando batia a fome
Vó Januária
torrava
Caroço de algodão e servia,
Os meninos “degustava”
Era esse o alimento
Que nas horas do tormento
A barriga aliviava.
Mas o verdadeiro amor,
Que o Luiz se apegava,
Era mesmo uma sanfona
Que seu velho pai tocava,
Animando a região,
Samba, valsa e o baião,
Era essa a sua “estrada”.
E em meio a essa gente
Vai crescendo o Gonzagão,
Se apaixona por Nazinha,
Bate forte o coração,
Enteada de Raimundo,
Vejam só que outro mundo,
De Luiz a intenção.
Com Nazinha quis casar,
E ao amigo Vicente,
Pediu pra que ele sondasse
Se o pai da moça consente,
Veio a decepção,
Pois “o véi lhe disse NÃO”
Morria ali a semente.
Gonzaga decepcionado
Comprou logo uma peixeira,
Pra rua se dirigiu
E ali no “mei da feira”
“Diche umas tantas ao velho”
Ficou branco e amarelo
Foi só a paixão primeira.
Santana, a mãe quando ouviu,
A noticia “afiada”,
Esperou pelo moleque
Para ter conversa clara,
Era amiga do Raimundo,
Deu-lhe
uma surra no “fundo”
“Seu Luiz” não esperava.
“Dispois” dessa surra boa
Gonzaga não quis comer,
Nem falava com ninguém,
Dormia com pesadelos;
Preparou-se a ir embora,
A vergonha era de sobra,
E os amigos, como vê-los?
Vendeu logo sua sanfona
Que sofreu para comprar,
Comprou passagem de trem
E procurou se alistar,
Se mandou pra FORTALEZA,
Não sei se tinha certeza
De um dia poder voltar.
Serviu o exército um bom tempo,
Ali foi bom corneteiro,
“Beiço de Aço”
o apelido
Que os amigos “concederam”
E com a revolução
Foi um soldado-lição,
Capaz, veloz e ordeiro.
No tempo de Getúlio Vargas
Foi um soldado exemplar,
Mesmo contrário às guerras
Foi servir no Ceará,
Minas Gerais, Paraíba,
Mato Grosso e até no Rio,
Teve passagem por lá.
E foi lá no Rio de Janeiro
Pedir baixa militar,
Se “danou” para São Paulo,
Seu sonho realizar,
Comprou uma sanfona velha,
Trocando os tiros de guerra
Pelo fole a embalar.
Quando chegou em São Paulo
Foi para o Hotel Toscano,
De família italiana,
E mesmo amargurando,
Que a sanfona que comprou,
Foi roubado e nem pensou,
Mas continuou teimando.
Mas o dono do hotel
Vendo o sonho do rapaz,
Lhe vendeu uma sanfona,
Do seu filho, foi sagaz,
Daí em diante se viu
O mundo se descobriu,
Luiz se sentiu em paz.
A vontade de Gonzaga
Era os concursos vencer,
Coisa difícil na época,
Por ninguém lhe conhecer,
Mas o tempo foi passando
E seus projetos avançando,
Pra seu sonho acontecer.
Um
grupo de estudantes
Tiveram boa intenção
Sabendo sua origem,
O desafiaram então:
-Toque um forró pra gente!
Da sua terra, oxente,
Somos
daquela região!
Nesse tempo ele tocava
Valsa, samba e até “chorim”,
Coisa de gente granfina,
Carlos Gardel ou Chopim,
Viu sua hora chegar,
Zabumba e fole a tocar,
A sua chance enfim!.
“Lá no meu pé de serra
Deixei ficar meu coração;
Ai que saudade tenho,
Eu vou voltar pro meu sertão”
O sucesso foi tremendo,
O impulso que faltava,
Estudantes “tavam certos”,
Começou nova jornada,
Veio depois “vira e mexe”
E outros grandes sucessos
Que marcaram a sua estrada.
Programas em rádios famosas
Até na televisão,
A fama chegou em salto,
O prêmio “REI DO BAIÃO”,
Sem nunca perder o tino,
O nome do nordestino
Divulgando na nação.
Mas “depois” de muitos anos,
Já famoso e popular,
O Luiz teve um desejo:
Á terra sua voltar,
Rever amigos e parentes,
“Matutar” com a sua gente
Para “dispois” retornar.
Pega o seu carro novo
E a sua companheira,
Sanfona que lhe deu fama,
E pega estrada e ladeira;
Chega lá de madrugada,
Coração em disparada,
E vai abrindo a porteira.
Relembra os tempos de infância
E do “Luar do Sertão”,
Das farinhadas e das moças,
Dos “cabras de lampião”,
Dos amigos e camaradas,
Da poeira na estrada,
As lágrimas molham o chão.
Ao chegar na casa velha,
A lua ainda a brilhar,
Grita com peito valente:
Vamos ver se vão lembrar,
Ô de casa, Ô de casa!,
Seus olhos cheios de água
Ninguém responde de lá.
Como não houve resposta,
Se lembra então do prefixo,
Que no sertão é famoso:
-Louvado Nosso Senhor Jesus Cristo!
-
Pra sempre seja
Deus louvado!
Seu velho pai acordado,
Vem atender seu pedido.
Enquanto o “véi” abre a porta,
Luiz pela brecha “espia”,
Vê sua casa de infância,
Até seu corpo arrepia,
A emoção é demais,
Até o cheiro dos pais
Ele nunca esquecia.
Antes de identificar-se grita:
Um caneco d’água eu quero!
Pois tô morrendo de sede
E escuta ali com esmero
O “Tibungo” da vasilha
Trazendo a água bem fria,
Que vinha dum pote velho.
Pergunta o véi: - Quem me chama?
-
É Luis, seu
filho, pai!
-
Tenha vergonha,
isso é hora?
E um abraço ali vai,
Os irmãos se despertando,
Depois o sol de acordando
E a madrugada se esvai.
Depois de matar a saudade,
Volta para a capitá,
Onde grava muitos discos,
Sucesso aqui e acolá;
Convites e gravações,
Música e recordações
Até a noite raiar.
Gonzaga canta em rádios,
Teatro e televisão,
Palanques e praças públicas,
Sempre cantando o Sertão;
Defendendo a sua gente,
E plantando a semente
De paz em nosso rincão.
Foi figura importante
Na tentativa de paz,
Na sua terá Exu,
Frente às famílias rivais,
Com o filho Gonzaguinha,
“Prece por Exu novo” pedia:
Não à guerra e sim à paz!.
Na Rádio Clube do Brasil
Gonzagão se apresentou
Um programa muito ouvido
Que sua vida marcou:
“Alma do Sertão” o nome,
Nesse período e anos
Muito amigo ele arranjou.
Porém, todos tem o seu dia
De receber o chamado,
Findar a labuta terrena,
Deixando aqui seu trabalho,
Exemplo e dedicação,
Saudade e recordação,
Deixar pra trás o arado.
No ano de oitenta e nove (1989,
No dia 02 de agosto,
Às 5:15 da manhã,
Um despertar de desgosto,
Morre o Luiz Gonzaga,
Encerrando a sua estrada
De grande exemplo e esforço.
Cantou o nosso Brasil,
O Pajeú e o Sertão,
O caboclo, o sertanejo,
“Os cabras de lampião”,
Sempre com chapéu de couro,
Sanfona e uma voz de ouro,
Divulgou nossa nação.
A Asa Branca e o Assum Preto,
O Jumento é nosso irmão,
Boiadeiro e Paraíba,
O Luar do meu Sertão,
Lá na Sala de Reboco,
Pra branco, preto ou caboclo
Foi ele a voz do Sertão.
A vida do Viajante,
Na peneira penerando
Respeitando
o Januário
O boiadeiro aboiando
Açucena cheirosa
Asa
Branca indo embora
Pouco depois retornando.
Da Feira de Caruaru
Ele também se “alembrou”
Dois
Siris jogando bola
Triste partida
marcou
Falando sério ou brincando;
Homenagem ou protestando
Sua terra ele cantou.
Minha vida é andar por esse país
Pra ver se um dia descanso feliz...
“O jumento é nosso irmão, ão, ão, ão, ão”
Cadê a flor que tava aqui – poluição comeu
O peixe que é do mar? Poluição comeu.
O verde onde é que está – polução comeu
Nem o Chico Mendes sobreviveu...
O Gonzaga foi
embora
Mas deixou o sem exemplo,
Pras futuras gerações
Se servir como alimento,
Ouvir canção e poesia,
Com mensagem e alegria,
Pro povo um divertimento.
Meus jovens ouçam os novos,
Mas não esqueçam a cultura,
Quem valoriza o passado
Tem boa vida futura;
Quem
foi bom será lembrado,
Quem é ruim será riscado,
Hoje o ruim ta em fartura!.
Obrigado por me ouvirem,
Até outra ocasião,
Foi um encontro marcante,
O meu respeito de irmão,
Viva a nossa cultura
Muito sucesso e candura,
E viva o rei do baião!
Buíque (PE), 11 de Novembro de 2006
Autor
Paulo Tarciso Freire de Almeida
End: Rua Odilon Nopa de Azevedo, 45.
Centro. Buíque (PE). CEP: 56.520-000
Celular. (87) 9.9995-4400
Revisado em 02 de maio de 2012
Observação
Esta
obra foi apresentada na Faculdade do
Vale do Ipojuca – FAVIP no dia 13 de dezembro de 2006, a pedido da aluna
Fabiana Colaço, do curso de Jornalismo,
como parte integrante do trabalho acadêmico com o tema: A imortalidade do Rei do Baião.
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